Os empresários brasileiros estão diante de um daqueles momentos silenciosos em que o país muda as regras do jogo e boa parte do mercado continua se comportando como se nada tivesse acontecido.
O Projeto de Lei nº 1087/2025, aprovado na Câmara dos Deputados e em análise no Senado, propõe duas movimentações simultâneas: de um lado, amplia a faixa de isenção do IR para as rendas mais baixas; de outro, institui um modelo de Imposto de Renda Mínimo Global da Pessoa Física (IRPFM), com alíquota mínima efetiva sobre o conjunto dos rendimentos, alcançando justamente quem concentra renda em lucros, dividendos e rendas hoje isentas.
Não é apenas “tributar dividendos”. É alterar a lógica da relação entre pessoa jurídica e pessoa física. O alvo direto é o arranjo clássico dos últimos anos: pró-labore simbólico, distribuição elevada de lucros isentos, lucros acumulados “para decidir depois”, patrimônio crescendo no CPF com baixa carga e documentação societária frágil.
E aqui entra o elemento que quase ninguém está levando a sério: o tempo.
O ano-calendário de 2025 tende a funcionar como linha de corte entre dois regimes. Até 31 de dezembro de 2025, ainda é possível organizar lucros sob as regras atuais — distribuindo ou revertendo em capital social lucros apurados, desde que haja contabilidade idônea, balanço encerrado em tempo, atas claras e decisões formalizadas. A partir da entrada em vigor do novo modelo, tudo o que estiver mal documentado, mal datado ou artificialmente “empurrado” passa a ser um terreno fértil para questionamentos, retenções e complementações de IRPFM com base na renda global.
É nesse ponto que mora o risco invisível.
Lucros acumulados sem deliberação expressa
Contratos sociais omissos quanto a política de dividendos. Atas inexistentes. Balanços fechados tardiamente ou apenas “de gaveta”. Pagamentos diferidos sem amarra jurídica. Esse cenário permite que o Fisco reinterprete datas, enquadre distribuições como rendimentos sujeitos ao novo piso de tributação e trate como “vantagem indevida” o que poderia estar protegido se tivesse sido deliberado corretamente em 2025.
Ao mesmo tempo, o PL recoloca as holdings no lugar certo: não como promessa milagrosa, mas como instrumento técnico para organizar o fluxo entre empresas operacionais e pessoa física, centralizar resultados, planejar sucessão, diferir tributação de forma legítima e dar racionalidade ao caminho do dinheiro. Uma holding bem construída não “inventa isenção”; ela controla quando e como o lucro sai do ambiente empresarial para o CPF do sócio, respeitando a legislação.
A pergunta correta não é: “Quanto imposto vou pagar com o PL 1087/2025?”, mas: “O meu modelo atual de retirada, lucros, investimentos e patrimônio suporta um piso mínimo de tributação sobre toda a minha renda? Ou estou exposto porque confio em práticas antigas sem lastro formal?”
A resposta passa por três movimentos imediatos:
Arrumar a casa de 2025. Exigir balanços consistentes, assinados, com identificações claras dos lucros até 31 de dezembro de 2025. Mapear lucros de exercícios anteriores, decidir o destino (distribuir, capitalizar, reservar) e registrar essas decisões. A omissão aqui deixa de ser confortável e passa a ser um risco objetivo.
Revisar os instrumentos societários. Contratos sociais genéricos, acordos frágeis ou inexistentes, ausência de regras sobre distribuição de lucros, dividendos intermediários, quóruns, prazos, critérios entre sócios: tudo isso vira brecha. Em um ambiente de maior controle, documento ruim é convite para interpretação contra o contribuinte.
Redesenhar a relação pessoa física x pessoa jurídica. O modelo baseado apenas em “tirar o mínimo de pró-labore e o máximo de lucros isentos” entra em xeque quando a tributação passa a olhar o conjunto da renda. Quem possui múltiplas empresas, participações cruzadas, estruturas familiares, patrimônio relevante em CPF ou fluxo intenso de dividendos precisa tratar planejamento societário e tributário como pauta central — não como favor pontual ao fim do ano.
Quem enxergar esse ajuste como mera notícia política tende a ser surpreendido. Quem tratar 2025 como a última grande oportunidade de organizar lucros, patrimônio, sucessão e governança tende a atravessar essa transição com vantagem competitiva: menos exposição, mais previsibilidade, mais narrativa técnica perante o Fisco.
Exemplos práticos: quanto isso pode custar no seu bolso
Para tirar o tema do abstrato, alguns cenários didáticos com base na lógica proposta do IRPFM (valores meramente ilustrativos, dependentes do texto final da lei):
Exemplo 1 – Empresário que vive de lucros isentos
Imagine uma pessoa física que, em 2026, receba:
- R$ 900.000,00 de lucros distribuídos por sua empresa (renda hoje isenta);
- R$ 100.000,00 de rendimentos tributáveis (salário/pró-labore, por exemplo).
Total: R$ 1.000.000,00 de renda anual.
No modelo atual, o imposto concentrar-se-ia sobre os R$ 100 mil. No modelo com IRPFM, considera-se o total da renda. Suponha, a título ilustrativo, que a alíquota mínima efetiva aplicável nesse patamar seja algo próximo de 6,66%: o contribuinte deveria ter pago R$ 66.600,00 no conjunto.
Se, ao longo do ano, ele pagou apenas R$ 20.000,00 de IR sobre os rendimentos tributáveis, teria de complementar cerca de R$ 46.600,00 na declaração anual — justamente porque a maior parte da sua renda veio de lucros que antes eram integralmente isentos.
O recado: quem vive majoritariamente de lucros e dividendos passa a ser, na prática, o principal financiador do IRPFM.
Exemplo 2 – Sócio com altos dividendos mensais
Suponha um sócio que receba, a partir de 2026, R$ 100.000,00 por mês em dividendos da sua empresa.
Pela sistemática proposta, sobre dividendos mensais acima de determinado patamar haverá retenção de 10% na fonte, como antecipação do IRPFM.
- Dividendos no ano: R$ 1.200.000,00
- Retenção (10%): R$ 120.000,00
No ajuste anual, se a alíquota mínima efetiva for de 10% e o total devido também for R$ 120.000,00, ele não terá imposto adicional a pagar — mas terá financiado antecipadamente o caixa do governo ao longo de todo o ano.
O recado: mesmo quando não aumenta a carga final, o novo modelo afeta o fluxo de caixa dos sócios e exige planejamento para não estrangular liquidez.
Exemplo 3 – Quem se organiza em 2025
Agora imagine uma empresa com R$ 800.000,00 de lucros acumulados até 31/12/2025.
Cenário A: nada é deliberado em 2025.
Em 2026, ao distribuir esses valores, parte dessa renda entra no radar do IRPFM, sujeita a retenção e eventual complementação.
Cenário B: em 2025 a empresa:
- encerra o balanço em tempo,
- delibera a distribuição ou
- reverte total ou parcialmente os lucros em aumento de capital social, com atas formais e registros corretos.
Nesse caso, preserva-se a isenção sob o regime atual e reduz-se drasticamente o risco de o Fisco tratar esses valores como base da nova tributação mínima.
O recado: o mesmo lucro, com ou sem deliberação tempestiva, pode significar “zero de IRPFM” ou “complementação relevante em 2026”. A diferença é técnica, documental e de timing.
Esses exemplos mostram que o PL 1087/2025 não é um detalhe contábil: é um divisor entre quem domina o próprio modelo de renda e patrimônio e quem deixa a narrativa na mão da Receita Federal.
Como você pode sair na frente (antes que o Fisco chegue primeiro)
Em vez de esperar a sanção para “ver no que vai dar”, este é o momento de agir com método.
O meu escritório estruturou um diagnóstico tributário e societário específico para o cenário do PL 1087/2025, voltado a empresários, profissionais liberais e investidores que:
- possuem lucros acumulados relevantes;
- recebem (ou pretendem receber) dividendos significativos;
- têm múltiplas empresas, participações cruzadas ou estrutura familiar complexa;
- querem decidir agora quanto espaço darão para o IRPFM no seu resultado futuro.
Na prática, o que vamos fazer por você:
- Mapear lucros acumulados e reservas até 2025, identificando o que pode/deve ser deliberado ainda sob o regime atual, com segurança jurídica.
- Analisar aumentos de capital social com lucros, fortalecendo a estrutura societária e evitando que lucros antigos escorram para a base do IRPFM por falta de deliberação.
- Estruturar ou revisar holdings, quando fizer sentido ao seu caso, para organizar participações, sucessão e o fluxo entre empresa e CPF, com substância econômica real.
- Regularizar a documentação essencial: atas, livros societários, políticas de distribuição de lucros, ajustes contratuais e cláusulas que afastem interpretações automáticas desfavoráveis.
- Alinhar contador, sócios e estratégia, para que planejamento tributário, contabilidade e governança contem a mesma história — antes que o Fisco conte por você.
O prazo é claro: todas as decisões relevantes com base nas regras atuais precisam estar formalizadas até 31 de dezembro de 2025.
E aqui entra o contraponto que poucos estão enxergando:
Se o PL for aprovado com outro prazo, se a vigência for postergada, se o texto final atenuar a tributação ou mesmo se houver alterações significativas, quem tiver se organizado antes não perde nada. Pelo contrário:
- já terá lucros antigos corretamente documentados e protegidos;
- já terá estrutura societária e patrimonial coerente, pronta para qualquer cenário;
- já terá governança, atas, contratos e políticas internas que aumentam segurança jurídica independentemente da mudança legislativa.
Se, por outro lado, o projeto for aprovado nos termos atuais ou até com endurecimento maior, quem deixou para depois terá menos margem, menos tempo e menos argumentos.
Planejar agora não é apostar no medo. É usar a incerteza como janela de oportunidade: antecipar-se ao desenho final da lei, reduzir zonas cinzentas, organizar o fluxo entre empresa e pessoa física e mostrar, desde já, que seu patrimônio e seus lucros têm lastro, lógica e documentação. Se você quer saber se está exposto ou protegido, agende uma reunião de diagnóstico. Vamos olhar o seu caso com números, documentos e cenários concretos, para que você entre em 2026 com estratégia — e não com surpresa.


